domingo, 26 de junho de 2016

Tentar ganhar trunfos negociais com um referendo e ver o resultado estoirar-lhe nas mãos?

Onde já vimos isto antes? Sim, na Grécia. E tudo parece encaminhar-se para que no Reino Unido, tal como na Grécia, o resultado do referendo seja exatamente oposto ao pretendido, se uns acabaram por engolir mais austeridade, outros engolirão mais integração europeia. E não, a culpa não foi de Bruxelas (nem Berlim). Maus políticos nacionais são eleitos por eleitorados nacionais.

PS: Olha a palermice a querer fazer escola também em Portugal

sábado, 25 de junho de 2016

Good bye Britain

Reuniões de emergência em Bruxelas, Berlim, Dublin... mas em Londres nada. Começa a ser óbvio que para uma boa parte do Leave (Boris & Cª) o referendo era um bluff para conseguir ainda mais privilégios e carimba-los com um segundo referendo e pelo meio tomar de assalto o governo. 

Não perceberam que fazer um segundo referendo para um tratado que se quer aprovar (como fez a Irlanda com o tratado constitucional depois convertido em "de Lisboa") é muito diferente de fazer um referendo para uma saída unilateral. 

Nas redes sociais tags como #unBrexit e #Breturn vão ganhando adeptos e o site do parlamento britânico foi-se abaixo com a popularidade de uma petição a pedir um segundo referendo. É triste que muita gente não tenha percebido as consequências do referendo, mas não foi por falta de avisos e não foram só "pobres alienados da política". Da imprensa tablóide aos ditos partidos andou tudo a ignorar o óbvio: leave means leave. 

Hurry up, chop chop! 

domingo, 6 de dezembro de 2015

Charros homeopáticos já

Não vale a pena sequer argumentar contra uma banha da cobra já completamente descredibilizada pela ciência. Mas se o BE reconhece méritos na homeopatia o melhor é passar das palavras aos atos e promover charros homeopáticos, charros só com uma quantidade simbólica, altamente diluída, de marijuana. O efeito, supõe-se, há-de ser o mesmo. Ou então não, e acabam com essa palermice da homeopatia. 

#JeSuisSanBernardino #JeSuisLondres

O que os ataques em San Bernardino e agora em Londres mostram, mais uma vez, é que há uma minoria significativa de muçulmanos que simpatiza com o Estado Islâmico e que alguns, nessa minoria, volta e meia se transformam em terroristas espontâneos por conta-própria (como pede o EI na sua propaganda). Como se combate isto? Eu não sei, e não há milagres. Mas reconhecer o problema é capaz de ser o primeiro passo. 

O proselitismo de supostos moderados usando por vezes movimentos de esquerda como plataforma não parece estar a dar resultados. Acho mesmo que é parte do problema, nunca da solução. O conservadorismo religioso, venha de onde vier, não pode ter lugar à esquerda. É tão aberrante como sei lá... promover a homeopatia (ups). Enfim, não se combate o extremismo com conservadorismo moderado. Os ataques vão continuar a pipocar e insistir na cassete da "religião da paz" não resolve nada. A religião é parte do problema, não será parte da solução. Racionalismo precisa-se.

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Culpar o Hondt para que tudo fique na mesma

A ignorância em relação ao sistema eleitoral português que quer políticos, quer jornalistas revelam é assustadora e indesculpável.  Há dias a Agência Lusa espalhou um pouco por toda a imprensa (Expresso, Jornal de Notícias, Rádio Renascença, Diário de Notícias etc.) uma notícia que, reconhecendo um problema real do sistema - demasiados votos que não servem para eleger ninguém: 762.000 - aponta culpas ao alvo errado:

«O PAN elegeu o seu único deputado, André Lourenço e Silva, no círculo de Lisboa, com 22 628 votos. Ao todo, o PAN obteve 75 140 votos, sendo que, cerca de 30% destes votos, bastavam para eleger o seu deputado.

A razão para que tal aconteça é o método de Hondt.»

É difícil perceber como terá chegado o autor da notícia a tal conclusão, uma vez que os tais 75mil votos do PAN foram obtidos a nível nacional e o método de Hondt é simplesmente o método que distribuiu os mandatos em cada círculo eleitoral.  São os círculos de pequena dimensão, e não Hondt, os principais responsáveis pela enorme quantidade de votos no lixo, como escolheu titular o DN.

É verdade que Hondt favorece ligeiramente os maiores partidos em desfavor dos mais pequenos, mas essa é uma influência residual, na maior parte dos casos fosse a distribuição feita pelo método de Hondt ou outro método proporcional, o resultado seria o mesmo. Nada seria diferente por exemplo no círculo de Portalegre, apesar de noticiar a Lusa:

«Por exemplo, no distrito de Portalegre votaram 59 004 e foram eleitos dois deputados, um para o PS e o outro para o PSD. O PS obteve 25 037 votos e o PSD/CDS-PP 16 303. Após o cálculo do método de Hondt conclui-se que o PS teve um excedente de 8 734 votos e o PSD/CDS-PP 3 785. Contabilizando os votos de todas as forças políticas neste círculo, 28 159 votos não tiveram representação em mandatos.»

O resultado em Portalegre teria sido exatamente o mesmo com outra qualquer distribuição, o problema não é esse, o problema é que Portalegre só elege 2 deputados. Assim, tendo o PS 42% dos votos e o PSD menos de 28% cada um elege um deputado, se nas próximas eleições se inverter a ordem de forças (o que representaria uma enorme mudança política no distrito), continuará a dar empate em número de deputados. E a CDU com 12% não elege ninguém. 

Resumindo, Portalegre é demasiado pequeno para ser um círculo eleitoral, a representatividade do voto das pessoas em Portalegre é praticamente nula: 30% dos votos são em partidos que não ganham qualquer assento (lixo) e 70% dos votos dão um empate em número de deputados apesar do PS ser muito maior do que o PSD no distrito. 

Portalegre é o caso mais extremo - a par dos círculos da emigração - mas não é caso único. Bragança, Beja e Évora, cada um com 3 deputados eleitos, não têm muito mais representatividade. Idem para os 4 da Guarda. Redesenhar este mapa eleitoral, fundindo círculos, seria a forma mais fácil de corrigir o sistema sem o alterar profundamente. O Alentejo, Trás-os-Montes e a Beira Interior podiam ser círculos eleitorais resultantes dessas fusões. 

Mas existem outras alternativas, como um círculo nacional que aproveite a maioria destes votos perdidos. A representatividade nunca será perfeita, e nem é desejável que o seja - a bem da governabilidade - muitos países têm limites mínimos para um partido ganhar representação no parlamento (3 ou 5%). Em Portugal o que há é uma enorme disparidade entre círculos, sendo que em Lisboa é relativamente fácil um pequeno partido ganhar representação eleitoral e em vários outros círculos votar no 3.º ou mesmo 2.º partido (círculo fora da Europa) não ajuda a eleger qualquer deputado.

E notícias como este disparate da Agência Lusa, acriticamente reproduzido por todo o lado, não ajuda nem ao esclarecimento, nem ao debate. Muito melhor fez a revista Visão antes das eleições.

Este mapa mostra os votos sem representação em cada círculo para as legislativas de 2011:


E esta tabela mostra como as coisas podiam ter sido diferentes com um círculo nacional agregador dos votos desperdiçados:



terça-feira, 6 de outubro de 2015

Não se entala quem tem a faca e o queijo na mão

O PS só se entala se quiser. Qual é a pressa? Porque a múmia falou? Governos de coligação, sobretudo aquelas que não estão já vislumbradas antes da eleição, demoram muito tempo a cozinhar, na Bélgica passa um ano e ninguém perde o chão por isso. O que o PS devia fazer: 

1) Lembrar que o apuramento dos resultados e consequente medir de forças na AR ainda não está feito e que negociações detalhadas de possíveis governos de coligação só podem ser feitos depois disso. Imaginem que o PS acaba com mais deputados do que o PSD p.ex. (improvável, mas possível), nesse caso qualquer coligação que envolva PS e PSD deve ter o PS como líder, ou seja, Costa PM. 

2) Que bom, o PCP e o BE querem negociar! Ótimo, primeira abertura em décadas. Recordar que o Livre é um fruto da recusa do BE em negociar soluções de governo com o PS. Isto é progresso, isto é ótimo. E o PS devia começar a negociar imediatamente. Até para que se perceba se o PCP e BE querem mesmo negociar, fazer compromissos e cedências, procurar consensos entre os muito diferentes programas eleitorais. Ou se só querem entalar o PS. O PS só se desentala se começar já a negociar com eles. Na pior das hipóteses dão uns muito divertidos calafrios à direita. 

3) Ir avisando o "PÀF" que um indiscutível derrotado da noite eleitoral foi o CDS, perdeu mais de 60% de votos nas ilhas e o único deputado que tinha. PSD+CDS em 2015 tiveram os mesmos votos que o PSD sem CDS em 2011. Os deputados que conseguiu à custa do PSD não chegam para nada, não viabilizam governo nenhum. Pelo que se o PSD quiser coligar com o PS tem escolha simples, correr já com o CDS. O PS deve deixar claro que não faz tensões de se sentar à mesa com o CDS. Política é isto, fazer Portas engolir o seu discurso de domingo à noite, quando pedia a demissão de Costa. 

Por outro lado se o PS considerar de facto ir para um governo de bloco central deve ter noção que deixar a oposição apenas à sua esquerda é o seu suicídio eleitoral. Só com o CDS na oposição, e zangado com o PSD, haverá possibilidade de sobrevivência para o PS. 


4) É ok o PS ficar na oposição, viabilizando um governo PÀF. É o "costume" em Portugal. Mas é uma solução que garante instabilidade governativa e prováveis eleições antecipadas, não sendo líquido que o PS consiga aproveitar o melhor momento para se fazer ao poder. Nunca subestimar o poder de autovitimização da direita. O maior poder que o PS tem é agora, e se for essa a saída escolhida as linhas vermelhas para o governo têm que ser traçadas de forma muito clara para que o PS dê o chumbo sem medo quando for necessário fazê-lo. 

A quem achar tudo isto muito estranho leia este artigo do Expresso que mostra vários casos europeus (os nossos parceiros como lembrava a múmia), em muitos deles não teria havido qualquer dúvida em classificar o PÀF de derrotado da noite. Mas em Portugal a baixar de 50% para 38% continuavam a falar em "grande vitória" e os jornalistas da TV só abanavam com a cabeça que sim. Durou uma noite, já perceberam que dependem do PS para tudo.

sábado, 19 de setembro de 2015

Angústias de um eleitor português residente no estrangeiro

1) O emigrante quando atualiza a sua morada no cartão do cidadão - para a morada no estrangeiro - vê automaticamente o seu recenseamento eleitoral anulado. Para poder voltar a votar deve recensear-se no seu consulado. O processo podia ser automático, como é em Portugal, mas não é. Isto bastará para garantir que uma boa parte dos emigrantes nunca sequer façam o registo eleitoral - todos aqueles que vivam a alguma distância dos seus consulados.

Propaganda PÀF endereçada à minha pessoa e morada
2) O eleitor emigrante não sabe, porque não é informado sobre isso, mas quando faz o seu recenseamento eleitoral está automaticamente a garantir o acesso ao seu nome e morada a qualquer partido político português que deseje esses dados. A CNE garante que isto é legal e invoca o artigo 4º do Decreto- lei nº 95-C/76 (Organização do Processo Eleitoral no Estrangeiro). Uma lei de 1976 que entra em claro conflito com o mais elementar bom senso e provavelmente com a lei de proteção de dados. Apesar da própria Comissão Nacional de Proteção de Dados ter emitido uma deliberação em favor desta grosseira violação de dados.

Depois de muitas queixas nas redes sociais por vários emigrantes o caso chegou ao Jornal de Notícias, era bom que não caísse no esquecimento. Não é difícil imaginar uma série de usos indevidos que os partidos podem dar a esses dados. Se a minha confiança nos partidos com assento parlamentar é pouca, que dizer de partidos como o PNR ou absolutos desconhecidos como "Nós, cidadãos" ou "PURP"? 

Em 1976 ainda não havia internet. O emigrante que se interessa por política ao ponto de fazer o seu recenseamento eleitoral no consulado - uma absoluta minoria dos emigrantes - não depende destes panfletos ridículos para formular a sua opinião.


3) O voto emigrante nas legislativas é feito por correio. O voto por correio é comum em vários países, não só para emigrantes mas também para locais. Por exemplo quando vivi na Alemanha recebi por correio informação sobre esse sistema de voto, e se entendesse votar por essa via bastaria enviar um formulário de volta. Tudo sem selos e sem complicações, desobrigando o eleitor a estar na sua zona de residência no dia da eleição. 

Morada indicada no envelope a enviar para Lisbonne
3.1) O voto para as legislativas portuguesas é ligeiramente mais complicado. Primeira complicaçãozinha escusada, é preciso uma fotocópia do cartão ou certidão de eleitor ou ficha de eleitor impressa do site. Como passo de certificação de que o voto foi mesmo feito pelo eleitor em causa parece-me um bocadinho pífio. Mas como chatice para pessoas sem impressora em casa pode ser bastante eficaz.

3.2) Vejam a morada ali em cima, é do envelope branco que deve ser usado para enviar o envelope verde com voto para Portugal. E sim, é bom que o carteiro saiba que "Lisboa" (nome que é quase sempre diferente noutras línguas) é em Portugal, porque o envelope feito para esse envio internacional não o indica. Nestas pequenas coisas se vê o desmazelo reinante. 

3.3) É expressamente proibido colocar o envelope branco noutro envelope para fazer o envio, isto apesar do envelope branco ter indicado o nome, morada e número de eleitor. Para um sistema eleitoral que confia pouco no voto por correio há aqui muita confiança em quem lida com o envelope. 

3.4) A proibição de colocar o envelope branco dentro de outro envelope é ainda mais irritante quando o envelope branco tem que ser selado. A administração eleitoral aconselha, mas não obriga, ao envio registado. Aqui no Luxemburgo isso significa que cada voto custa ao eleitor 4,95€ (ou 0,95€ sem o registo). Uma família ou grupo de amigos podia facilmente poupar bastante dinheiro usando um envelope grande comum. 

Parecerão coisas poucas, mas são irritantes e de utilidade duvidosa e sobretudo suficientes para desmotivar o já nada motivado eleitorado emigrante, que, é bom lembrar, elege 4 deputados. Outra originalidade tuga: círculos eleitorais extra-territoriais. Mais que uma originalidade, um absurdo, uma panelinha PS-PSD (os únicos partidos capazes de eleger deputados nestes círculos) que não representa ninguém.

Em 2011 só 33.059 emigrantes votaram, de um total de 195.109 emigrantes inscritos para votar, de um total potencial superior a 3 milhões de portugueses emigrados pelo mundo (há quem diga 5 milhões). 33.059 votos que decidiram 4 deputados. A título de comparação nesse mesmo ano, com 61.819 no círculo do Porto, a CDU só elegeu 2 deputados. Enquanto que o PSD elegeu 3 dos 4 deputados da emigração com 13.634 míseros votos.

Está mais que na hora de extinguir estes absurdos círculos da emigração e substituí-los por um círculo nacional que aglomere os votos dos poucos milhares de emigrantes interessados e todos os outros votos desperdiçados pelo país fora.

[Atualização 22/09/2015] Finalmente o caso da morada dos envelopes (ainda mais confusa no círculo fora da Europa) chega aos media, onde se relatam também outros problemas relacionados com a morosidade dos correios fora da Europa. Lê-se e mal se acredita: «O secretário de Estado das Comunidades conta que “na Venezuela, tradicionalmente, os (boletins de) votos nem conseguem chegar”.» A Venezuela tem uma das maiores comunidades de emigrantes portugueses, e pelos vistos "tradicionalmente" ninguém vota. Tradicionalmente ninguém tentou resolver o problema. Porque não, p.ex., serem as embaixadas não-europeias a distribuírem e a recolherem os votos? Assumindo que os envios nacionais são consideravelmente mais fiáveis e rápidos. 2 deputados são eleitos pelo círculo fora da Europa, quase sempre os 2 são do PSD, eleitos com os votos que calham chegar, tradicionalmente... Ok, ko.